Alteração tomográfica em hospital primário não é sinônimo de encaminhamento

Evidências para qualificar encaminhamentos e evitar sobrecarga desnecessária na rede hospitalar

Alterações encontradas em tomografias computadorizadas (TC) realizadas em hospitais de atenção primária frequentemente geram insegurança entre equipes locais e levam a encaminhamentos excessivos para centros de maior complexidade. Entretanto, estudos recentes — incluindo esta revisão integrativa publicada na BioScience — demonstram que uma alteração na TC nem sempre significa gravidade e não deve, isoladamente, determinar transferência imediata.

O CEANNE, atuando em dezenas de hospitais em diferentes níveis de complexidade, reforça a importância da interpretação criteriosa dessas imagens e do uso racional dos recursos da rede, garantindo que pacientes realmente graves tenham prioridade e evitando deslocamentos desnecessários.

Por que esse estudo é importante?

Hospitais primários frequentemente operam sem a presença de neurologistas ou neurocirurgiões. Assim, muitas das decisões de encaminhamento se baseiam:

apenas no laudo de um radiologista geral,

sem integração com contexto clínico,

sem segunda opinião especializada,

e sem considerar preditores de gravidade clínica.

O resultado é um cenário de:

transferências excessivas,

superlotação de centros de referência,

custos desnecessários,

ansiedade ao paciente,

e profissionais sobrecarregados.

Este estudo traz evidências que ajudam a redefinir critérios de encaminhamento.

Método da revisão

A pesquisa seguiu o modelo de revisão integrativa, analisando literatura nacional e internacional a partir da pergunta norteadora:

“Como interpretar a necessidade de encaminhamento emergencial a partir de uma alteração tomográfica?”

Foram incluídos artigos originais nas bases PubMed, Medline/BVS e ScienceDirect, resultando em 11 estudos considerados relevantes.

Principais achados da revisão

  1. A maioria das alterações tomográficas não exige encaminhamento imediato

Em crianças com epilepsia atendidas em serviços primários:

33% tinham alterações na TC;

menos de 3% eram achados graves que requeriam avaliação neurocirúrgica (tumores, granulomas).

Ou seja: alteração não é sinônimo de emergência.

  1. Profissionais da emergência têm boa acurácia na leitura inicial

Comparações entre clínicos e neurorradiologistas revelaram:

concordância superior a 85% na interpretação das TCs;

falsos negativos em apenas ~4%, e nenhum deles relacionado a condições que exigissem intervenção urgente.

A história clínica e o exame físico são determinantes para evitar erros.

  1. Critérios clínicos reduzem drasticamente TCs e encaminhamentos desnecessários

Aplicar critérios objetivos (idade > 60, déficit focal, alteração mental, cefaleia súbita com vômitos, ECG < 14) resultou em:

até 30% menos TCs,

sem perda de diagnósticos graves.

Seleção adequada melhora eficiência do sistema.

  1. Segunda opinião especializada reduz superencaminhamentos

Neurorradiologistas discordaram de radiologistas gerais em:

~20% das reinterpretações,

com mudança de conduta em até 7% dos casos.

Ou seja, um segundo olhar muda desfechos.

  1. Telerradiologia aumenta segurança e evita transferências desnecessárias

Estudos mostram que quando neurocirurgiões avaliam TCs remotamente:

94% dos pacientes com trauma craniano não precisam ser transferidos;

apenas 4% evoluem para transferência tardia.

A telerradiologia é ferramenta essencial na rede SUS e privada.

Conclusão institucional

A revisão confirma que alteração tomográfica por si só não significa necessidade de encaminhamento. Decisões devem ser tomadas com base em:

contexto clínico,

exame físico,

critérios objetivos,

avaliação neurológica estruturada quando possível,

segunda opinião radiológica,

e ferramentas como telerradiologia e teleneurologia.

O CEANNE, referência nacional em neurologia e neurocirurgia, reforça a importância de qualificar a triagem nos hospitais primários, diminuindo superencaminhamentos e garantindo atendimento especializado para quem realmente precisa.

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